Orgulho, sinônimo de resistência e luta
A palavra orgulho carrega um significado muito mais profundo para pessoa LGBTQIA+. É, sobretudo, um sinônimo de resistência e luta.
Publicado: 28 Junho, 2023 - 09h26 | Última modificação: 28 Junho, 2023 - 10h27
Escrito por: Leandro Gomes
Definida como um “sentimento de satisfação com os seus próprios feitos e qualidades ou com as realizações de outra pessoa”, a palavra orgulho carrega um significado muito mais profundo quando se trata da pessoa LGBTQIA+.
Não é apenas sobre satisfação. É muito mais que isso. É, sim, sobre ter orgulho de ser quem é e de pertencer a uma comunidade plural ─ mesmo com todas as limitações impostas pela sociedade ─, mas é, sobretudo, um sinônimo de resistência e luta.
E resistir e lutar é preciso. Isso porque o Brasil ainda é extremamente hostil e segue sendo o país com maior número de assassinatos de pessoas LGBTQIA+ no mundo. De acordo com dados do Grupo Gay da Bahia, em 2022, foram registradas 256 mortes violentas ─ 242 assassinatos e 14 suicídios ─, o que representa uma morte a cada 34 horas.
Neste mês de junho ─ em que se comemora o Mês do Orgulho LGBTQIA+ ─, a CUT-DF conversou com algumas pessoas para entender o que significa o orgulho e quais são os desafios diários enfrentados pelo grupo.
Quando não mata, deixa marcas
Gabriel Silva, 29, um homem gay, preto, favelado e descontruído, já sentiu na pele o peso do preconceito e da hostilidade do Brasil LGBTQIA+fóbico. E sentiu de forma literal. Em um dia qualquer de 2014, o então estudante de jornalismo voltava para casa após uma tarde no parque. Ao se despedir de um amigo com um abraço, na Rodoviária do Plano, foi surpreendido com um soco deferido por um desconhecido.
“Viado maldito”, gritava o agressor.
Assustado, sua única reação foi chorar, sair de perto do criminoso e buscar conforto nos braços de amigos e familiares, que o acolheram e deram o suporte necessário. Gabriel chorou por dias. A marca no rosto era menos dolorida que a dor em seu coração. Quase 10 anos após o triste episódio, Gabriel segue resistindo em uma sociedade que parece não querer sua existência e a dos seus semelhantes.
“Naquele dia, me senti muito vulnerável, muito triste mesmo e com medo de ser agredido outra vez e ter que vivenciar essa situação novamente. Hoje, estou mais forte e corajoso para lidar com esse tipo de gente”, conta.
Liberdade de ser quem é no trabalho
No Brasil LGBTQIA+fóbico, nem todo mundo se sente confortável para se orgulhar e ser quem é em todos os espaços. Às vezes, como estratégia de defesa, é preciso se resguardar e omitir informações para manter o trato social. O ambiente de trabalho é um claro exemplo disso.
Além das dificuldades para se conseguir emprego, quando empregada, a pessoa LGBTQIA+ não é livre para se expressar em sua totalidade, uma grave violação do direito à cidadania plena.
Gabriel Silva, que foi agredido na rua, também sofreu agressões no local de trabalho. Não físicas, verbais. Mas, ainda assim, agressões, que o oprimiram. Quando sequer havia contado para a família sua orientação sexual, dedos já apontavam: “é bicha”.
“Na época em que eu era menor aprendiz, escutava muita chacota, muita piadinha sobre mim. Eu ainda nem era assumido, mas meus colegas de trabalho ficavam me chamando de termos pejorativos pelo meu jeito de ser. Não era uma coisa legal de se ouvir”, conta.
E é justamente para evitar esse tipo de situação, que Rose Uranga, do Coletivo LGBTQIA+ da CUT-DF, não se sente confortável para falar sobre sua sexualidade no ambiente de trabalho. O medo de sofrer algum tipo de violência ou até mesmo de perder o emprego tem tirado dessas pessoas o direito de existir com plenitude.
“Não me sinto à vontade. Apenas junto de amigos e espaços de luta. O maior impedimento é o preconceito, pois, apesar de alguns colegas parecerem mais abertos, ainda assim têm as piadinhas de mau gosto, preconceituosas. Para minha proteção mental e não gerar embates desnecessários, prefiro ficar na minha. Mas isso não me impede de falar com pessoas que inspiram mais confiança e muito menos de retrucar alguma situação preconceituosa que presencio”, disse.
Coletivo LGBTQIA+
Com o objetivo de combater o preconceito no ambiente de trabalho, criar um espaço humanizado e fomentar a criação de instrumentos que garantam os direitos sociais e trabalhistas às pessoas LGBTQIA+, a CUT-DF criou um Coletivo especifico para debater o tema.
“A CUT entende que toda luta que queria enfrentar de maneira concreta as dificuldades, as discriminações, deve, necessariamente, ser interseccionalizada. Nesse contexto, a LGBTQIA+fobia pode ser entendida como fator de precarização da vida humana”, explica João Macedo, do Coletivo.
A partir do trabalho desenvolvido pelo Coletivo da CUT-DF, alguns sindicatos filiados à Central também criaram seus próprios Coletivos, como foi o caso do Sindicato dos Bancários de Brasília e o Sindicato dos Professores no DF (Sinpro-DF).
“Outras ações promovidas nessa trajetória são as mobilizações nas ruas, nas redes e nos movimentos sociais, além da participação nos encontros formativos regionais e nacional. A ideia é que mais entidades criem seus Coletivos e debatam as pautas especificas da comunidade com suas bases”, conclui João Macedo.
Conselho Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+
Outro importante espaço criado pensando no bem-estar deste segmento, é o Conselho Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+ do governo federal, no âmbito do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.
Instituído em abril deste ano por meio do Decreto 11.471, o Conselho conta com a participação de 19 representantes do governo federal e outros 19 da sociedade civil. O objetivo é discutir e retomar a participação social no desenvolvimento das políticas públicas voltadas ao grupo.
Na cerimônia de posse dos conselheiros, o ministro da Pasta, Silvio Almeida, falou sobre a importância da retomada do CNLGBTQIA+. “As pessoas LGBTQIA+ vão interferir diretamente na formulação de políticas públicas que irão afetá-las, não só a elas, mas todo o povo brasileiro. A partir de hoje, portanto, se tem uma institucionalidade na defesa dos interesses e dos direitos das pessoas LGBTQIA+, e isso não é pouco”, apontou.
Denise Soares, 28, representante da Art Jovem LGBT, uma das 19 conselheiras, conta como é integrar o CNLGBTQIA+, um instrumento tão importante para garantir o direito à cidadania ao segmento.
“Estamos na retomada de políticas públicas que foram dizimadas no último governo. Temos um trabalho árduo nesta gestão para que a população LGBTQIA+ seja, sim, prioridade e esteja inserida no orçamento. Ainda temos muito o que avançar e, junto à Secretaria Nacional do Governo, vamos tornar o Brasil um país sem preconceitos”, afirma.