Escrito por: Vanessa Galassi
Desafio posto, mãos à obra
Há quase 40 anos, trecho de análise apresentada no da 1º Congresso Estadual da Classe Trabalhadora, o 1º Ceclat-DF, trazia a necessidade de mudança radical diante do cenário marcado à época por arrocho salarial e ruptura com os direitos humanos. Uma mudança que deveria ser feita a partir da organização da classe trabalhadora. Hoje, quatro décadas depois, com pauta semelhante, uma nova mudança é urgente. Dessa vez, na própria estrutura do movimento sindical, para garantir a organização de uma classe trabalhadora que extrapolou as categorias formais e com vínculo empregatício tradicional.
“Para nós (da CUT), o processo organizativo é o maior desafio do momento, tanto do ponto de vista do home office como no contexto das novas categorias de trabalhadores”, afirma a secretária de Organização e Política Sindical da CUT Brasil, Graça Costa. Confiante de que há solução para o problema, a sindicalista lembra do exemplo das trabalhadoras domésticas, que se organizam mesmo sem estarem reunidas em um único local de trabalho. Para Graça Costa, a construção de um novo modelo sindical capaz de organizar a classe trabalhadora exige “escutar todos os ramos, pois cada um deles tem suas peculiaridades”.
Quando o tema é home office, o secretário de Organização da CUT-DF, Douglas de Almeida Cunha, afirma que “a grande dificuldade que os sindicatos enfrentam para se reorganizar é como chegar ao trabalhador”. “Antigamente a gente ia ao local de trabalho, entregávamos o jornal, conversávamos, realizávamos filiações. Agora, como iremos lidar com uma pessoa que pode estar empregada em Brasília, mas trabalhando em São Paulo ou em outro país. Como se chega a esse trabalhador? O sindicatos, de forma geral, ainda não têm organizado sequer uma forma de filiação dessas pessoas de forma virtual. As filiações ocorrem em uma ficha de filiação que tem que ser assinada presencialmente”, comenta.
Douglas, que compõe uma categoria em que cerca de 90% está em home office, a de empregados em Conselhos e Ordens de fiscalização profissional, já tem projetos para o fortalecimento da organização sindical no DF. “Aqui, acredito que os sindicatos poderiam pensar na criação, de forma solidária e coletiva, de um aplicativo da classe trabalhadora, onde o trabalhador entrasse nesse aplicativo e pudesse ser direcionado ao seu sindicato para fazer filiação, ter acesso a informações, a serviços que o sindicato presta. Isso funciona se for de forma solidária. Agora, se deixar para que cada sindicato enfrente esse problema individualmente, um problema que é de todos, ninguém vai conseguir sair desse buraco que estamos enfiados”, avalia.
Embora seja flagrante na classe trabalhadora brasileira, o problema da organização sindical com a massificação do home office e a consequente precarização dos direitos não é uma exclusividade do Brasil. De acordo com o secretário de Relações Internacionais da CUT Brasil, Antônio Lisboa, mundialmente, ainda não há muitas experiências de organização sindical em home office. “O que há são experiências de legislação sobre o trabalho home office em países como Espanha, França, Portugal e Argentina. E a corrida pela garantia dessas legislações, que não deixa de ser uma forma de organização sindical, implica em garantir a esses trabalhadores todos os direitos dos demais trabalhadores. No Brasil, especificamente, há especialmente a experiência do ramo financeiro, onde o direito dos trabalhadores atuarem em home office já está nas convenções coletivas dos bancos, com garantia de horário de descanso e outros direitos assegurados”, explica.
No caderno que embasa as discussões da 16ª Plenária Nacional da CUT, os possíveis caminhos que asseguram a organização sindical diante da nova configuração da classe trabalhadora apontam desde questões básicas, como o combate às práticas antissindicais, até outras mais amplas, como a unificação da luta com outros movimentos da sociedade civil.
“Na 16ª Plenária da CUT Nacional, analisamos que é fundamental promover ações amplas, solidárias e unificadas, seja em âmbito local ou nacional. É preciso reforçar o trabalho de base, se unir a movimentos culturais, sociais; ir às periferias. É urgente viver as ruas. Além disso, também precisamos, mais que nunca, investir em formação, em educação sindical e traduzir o sindicalês para quem quer que seja. Precisamos tornar a inventar”, afirma o presidente da CUT-DF, Rodrigo Rodrigues.
Está posto o desafio. Em jogo, a vida de mais de 200 milhões de brasileiros e brasileiras que em um passado não muito distante se organizavam enquanto classe trabalhadora para ampliar conquistas, mas, agora, muitas vezes, se veem privados até mesmo de esperança diante de um governo que traz como tônica a dicotomia entre emprego e direito.