Escrito por: Letícia SAlorenzo, Sinpro-DF
O debate aconteceu no último fim de semana
Como fazer a perspectiva da inclusão se sobrepor à perspectiva capacitista e medicalizada dos alunos com deficiência? O Sinpro-DF promoveu no último fim de semana o Seminário Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva e trouxe especialistas para debaterem a dimensão social da perspectiva inclusiva versus o modelo biomédico, que induz ao capacitismo.
O evento foi aberto pela fanfarra do Centro de Ensino Especial 01 de Taguatinga. A seguir, a primeira palestra debateu a Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva.
Matrículas aumentam; formação de profissionais tem oferta insuficiente
A primeira a falar foi a professora Olga Freitas, Pedagoga, professora aposentada da SEEDF, doutora em Educação, mestra em Neurociência do Comportamento, especialista em Neuropsicologia, Neuropsicopedagogia, Gestão Escolar, Libras e em Educação Inclusiva e Consultora da Unesco.
Olga apontou que a educação inclusiva vai muito além do acesso. É necessário garantir a acessibilidade, ou seja, os produtos, meios e ferramentas concretos que possibilitem usos específicos. A partir da acessibilidade, é possível garantir a permanência e a aprendizagem dos alunos público-alvo da educação inclusiva, com participação plena, ou seja, a execução de todas as atividades em condições de igualdade em relação aos demais estudantes.
Ao apresentar dados sobre a explosão de diagnósticos, principalmente de Transtornos do Espectro do Autismo (TEA), com um aumento de 280% em 2022, Olga trouxe a seguinte reflexão: esses comportamentos de diferentes ordens vêm sendo apresentados como doenças, transtornos, distúrbios que camuflam questões políticas, sociais culturais e afetivas q afligem a vida das pessoas. Estamos voltando ao modelo médico da deficiência ou estamos sem saber como lidar com comportamentos próprios de uma geração? Para a neuropsicopedagoga, a escola não consegue mais dialogar com a capacidade de aprendizagem de uma geração que já nasceu em ambiente digital.
Olga entende que a escola deve ser não apenas um espaço físico para transmitir conhecimentos, mas um ambiente dinâmico e interativo, que utiliza as tecnologias de ponta para construir conhecimentos e oferecer uma educação personalizada e adaptada às necessidades e interesses de cada aluno. Para ela, incluir é valorizar a diversidade cognitiva.
A coordenadora-geral de Estruturação do Sistema Educacional Inclusivo da Diretoria de Políticas de Educação Especial na Perspectiva Inclusiva do ministério da Educação, Liliane Garcez, lembrou em sua palestra que inclusão é a mudança de posturas e atitudes – e isso só acontece quando eu, de fato, convivo com o outro.
A representante do ministério da Educação informou que o número de matrículas da educação especial chegou a 1,8 milhão em 2023 – aumento de 41,6% em relação a 2019. De 2008 a 2022, as matrículas da Educação Especial aumentaram em 219%, sendo que as matrículas em classes comuns quadruplicaram, enquanto as ocorridas em classes exclusivas reduziram pela metade.
Para além da explosão de matrículas de alunos com deficiência, Garcez também apontou como desafios da educação brasileira na perspectiva inclusiva a exclusão e a evasão escolar, escolas com baixa acessibilidade, oferta insuficiente de formação para profissionais de educação e estudantes sem acesso ao atendimento educacional especializado (como salas de recursos).
A coordenadora do Ministério da Educação lembrou também que o governo anterior simplesmente desativou a Secadi, a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização de jovens e adultos e Diversidade e Inclusão.
Confira a seguir a apresentação da fanfarra do CEE 01 de Taguatinga e a primeira palestra do Seminário
Capacitismo x inclusão: quem vence?
Na palestra do sábado, sobre Problemáticas na Rede e Capacitismo, a Ativista, integrante da Frente Parlamentar em Defesa da Educação Inclusiva do DF, mãe típica e atípica e membro do grupo Pitt-Hopkins Brasil, Andréa Medrado, lembrou que o capacitismo é estrutural na sociedade. Ela alertou para algumas expressões capacitistas, como aluno “laudado”, ou “anjo”, ou “aluno com necessidades especiais”, ou mesmo expressões como “ele vive no mundo da lua”; “é incapaz de ser alfabetizado”; “ela vai ser curada, tenha fé”, ou “fingir demência”, dentre outros. Ensinou que o correto a se utilizar é “pessoa com deficiência”. O termo foi definido na Convenção Internacional sobre o direito das Pessoas com Deficiência, na ONU, e ratificado no Brasil, por decretos e leis. O modelo biomédico cuida da “cura” da deficiência, e a trata como anormalidade, o que induz à ideia de que existem estudantes capazes e incapazes. Já o modelo social da inclusão entende que o problema da deficiência reside na estrutura social que oprime a pessoa PcD, uma vez que ser deficiente é uma das muitas formas de estar no mundo. Logo, é preciso tornar os ambientes acessíveis por meio da eliminação das barreiras.
O diretor de Políticas de Educação Especial na Perspectiva Inclusiva do Ministério da Educação, Alexandre Mapurunga, trouxe alguns dados de sua dissertação de mestrado recém-defendida, sobre o capacitismo no contexto escolar. Para ele, a escola deve educar todos os alunos em igualdade de condições e proteger os alunos com deficiência de todas as formas de discriminação. O capacitismo é uma dinâmica que nega a inclusão, naturaliza a exclusão cria barreiras para participação plena e resulta na justificação do uso de práticas pedagógicas excludentes, falta de recursos adequados para práticas inclusivas e a segregação em ambientes educacionais exclusivos.
Confira a seguir a palestra do segundo dia do seminário